Os supermercados foram, sem dúvida, o comércio protagonista e de grande destaque nos dois últimos anos. Com o impacto da pandemia sobre todos os setores, o dos alimentos foi um alicerce que se manteve em pé para manter a sociedade viva e abastecida. Com o fechamento generalizado de vários segmentos e o isolamento social, em 2020 o setor supermercadista teve que vencer o desafio de se adaptar em tempo recorde às altas demandas, ao atendimento delivery / e-commerce em grande escala, e à manutenção das prateleiras e gôndolas com produtos disponíveis – mesmo com a desaceleração das indústrias de alimentos e produtos essenciais, e a falta ou demora na chegada de muitos itens. Foi um momento inesquecível para os supermercadistas, obrigados a reinventar o seu negócio da noite para o dia.
Com restaurantes e bares fechados, turismo zerado e sem nenhuma opção de alimentação fora de casa, o cenário se transformou com as pessoas tendo que diariamente preparar a própria comida e consumir alimentos in home. A corrida aos supermercados foi grande e as vendas no comércio naquele primeiro ano de pandemia aumentaram significativamente, enquanto em muitos outros encolheram.
Entretanto, paralelo a esse crescimento inesperado em 2020, o supermercadista enfrentou um clima também adverso: os custos das empresas aumentaram exponencialmente com a adaptação às novas exigências sanitárias, a contratação de mais colaboradores para atender a crescente demanda e a formação de novas equipes de atendimento às compras online. Oneroso e trabalhoso foi também garantir a disponibilidade dos produtos nas lojas e a manutenção de estoques, mesmo com os atrasos na produção e entraves nos transportes e distribuição. A logística toda teve que ser alterada, gerando mais custos e despesas concomitante ao aumento nas vendas.
A pandemia de 2020, como sabemos, foi um caos que abalou os países de todos os continentes na sua economia, política e relações sociais. Empresas faliram, o desemprego disparou, casamentos e eventos foram adiados, e a grande maioria das pessoas ficou em home office. Fora os hospitais, quase tudo parou. Menos os supermercados.
Ao fim de 2020 o clima de otimismo em relação ao novo ano pairava no ar. Parecia um marco também para o fim da pandemia e seus problemas. A Revista Checkout, naquela época, entrevistou o empresário Fábio Hiroyuki Iwamoto, sócio do Grupo Chama Supermercados, para saber dele o que esperar de 2021 para o setor. Mas ao contrário de otimista, Fábio foi bastante cauteloso:
“ Sinceramente, para mim ainda está tudo muito incerto. Na questão da economia, do comércio, há um ambiente de muita incerteza. Tem muita gente achando que o ano que vem será muito melhor. Mas eu tenho uma certa cautela. Inclusive, para preparar o nosso planejamento para o ano que vem, estou bastante preocupado em como fazer essa projeção – pois tudo é uma grande incógnita. A situação fiscal do país, por exemplo, preocupa muito, pois influencia demais na economia – e tudo vai depender de medidas do governo para melhorar essa situação fiscal. Também todo o gasto do governo esse ano, por conta da pandemia, afetará diretamente todos os setores. Há, portanto, uma diferença entre desejo e expectativa: eu desejo que seja um ano muito melhor, é claro – que as coisas voltem a uma certa normalidade…,mas, quanto a expectativas, eu ainda tenho um certo receio – acho que no primeiro semestre de 2001 ainda será um pouco difícil, e talvez no segundo semestre a economia volte a crescer…”
As previsões de Fábio Iwamoto foram certeiras. Agora, a Checkout voltou a falar com ele da sua visão sobre o que foi 2021 e o que esperar para o comércio em 2022. Confira o que disse o representante do Chama Supermercados:
“Em meio a uma esperança no controle da pandemia com o início da vacinação, o ano de 2021 começou bem em termos de vendas para o Chama, com o primeiro trimestre ficando acima do ano anterior, mesmo descontando a inflação.
Por outro lado, a realidade da pandemia mostrou que ainda estávamos muito longe do fim dela. Veio a segunda onda da Covid-19 que acabou nos afetando significativamente, deixando muitos colaboradores afastados, inclusive da administração. Isso comprometeu nossas operações e gerou muito mais custos.
A partir do segundo trimestre, as vendas pararam de crescer e na sequência começaram a cair, reflexo da reabertura dos restaurantes e bares e principalmente, pela queda na renda da população.
Para o final do ano, com a liberação do Auxílio Brasil e a perspectiva de muitas famílias voltarem a ser reunir para passar as festas, acreditamos que as vendas voltarão a crescer e temos que preparar bem as lojas para receber os clientes.
Para 2022, com a vacinação avançando e a pandemia mais controlada, a economia deve ganhar um fôlego. Contudo, a nossa perspectiva é de que ainda seja um ano muito difícil, devido à péssima situação fiscal do país que vem se arrastando, sem previsão de melhora, o que acaba impactando a cotação do dólar, gerando mais inflação e baixo crescimento. E sendo um ano de eleições presidenciais, sempre há mais instabilidade também.”
Os Desafios do Setor em 2021
A esperança era que 2021 entrasse botando para fora as restrições impostas pelo vírus e suas consequências avassaladoras mundo afora. Mas não foi assim. Mesmo com a chegada das vacinas, em ondas subsequentes a Covid 19 continuou inundando de imprevisibilidade qualquer negócio e cada uma das pessoas habitantes do nosso planeta. E com os supermercados não foi diferente.
Diante da crise generalizada e prolongada provocada pela pandemia do coronavírus iniciada em 2020, os supermercados em 2021 continuaram sendo um dos setores que mais se destacaram na economia nacional. O auxílio emergencial do governo federal, dado desde o ano anterior às pessoas mais necessitadas e desempregadas, teve que permanecer e, se por um lado garantiu o sustento de muitas famílias, teve também impacto positivo na venda dos alimentos. O home office prevaleceu e, com ele, o elevado consumo caseiro de gêneros alimentícios predominou. Também sem opções de viagens, laser e incentivo às compras supérfluas, os abastados gastaram mais com comidas, bebidas e prazeres que o comer bem pode dar. No primeiro trimestre de 2021, portanto, por todas essas razões as vendas no setor vinham no rastro do ano anterior. O crescimento do setor supermercadista era uma realidade.
O público consumidor, que já vinha escaldado de 2020, entrou em 2021 já com novos hábitos de compra, mais adaptado às mudanças impostas, e muito mais exigente. Uma pesquisa realizada pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) apontou a mudança de comportamento do consumidor brasileiro durante o isolamento: as compras online de bebidas e alimentos cresceram, os pedidos por aplicativos registraram alta e o consumidor se tornou multicanal.
Segundo matéria publicada na página do site Valor Agregado. com, em agosto de 2021, “Os supermercados viveram uma das maiores digitalizações da pandemia, buscando alternativas para chegar à casa do consumidor e driblar um momento de desafio das compras presenciais. Resultado da estratégia, esses negócios registraram um aumento de 900% na receita das vendas online entre março de 2020 e julho de 2021. Os dados são de levantamento da Linx, líder em tecnologia para o varejo, a partir de informações da vertical Mercadapp, especialista em e-commerce para supermercados. O salto sem precedentes nas vendas digitais e por aplicativo são consequência do aumento da procura: o número de pedidos virtuais cresceu 817% no mesmo período. “Em março do ano passado (2020), a pandemia e o isolamento social praticamente obrigaram o consumidor a buscar novas formas de fazer mercado. Porém, a procura não foi uma coisa momentânea: o consumidor experimentou, gostou e se acostumou a receber as compras em casa, sustentando esse crescimento inacreditável no último ano e meio, analisa Larissa Lima, diretora de operações da Mercadapp.”
Esseboom descrito acima, no atendimento às compras virtuais, já dá uma ideia do que foi para o setor varejista o desafio de se estruturar às pressas para fazer frente à essa demanda toda – e ainda conseguir pleno sucesso nessa empreitada. Foi, sem dúvida, uma conquista que se firmou em 2021 – e que só tende a crescer com os avanços da tecnologia e com os consumidores cada vez mais adeptos ao sistema. Na verdade, as compras por aplicativos, delivery e e-commerce deixaram de ser dominadas só pelos jovens, pois com a pressão da pandemia as faixas etárias mais resistentes também entrarem nessa onda. Pesquisas indicam que um grande percentual de pessoas com mais de 60 anos fez sua primeira compra online durante a quarentena – e a maioria delas justamente com itens de alimentação. Ponto para o setor.
Por outro lado, no entanto, as pessoas mais conectadas ficaram ainda mais atentas às opções que se abriram para as compras, e mais exigentes quanto à qualidade de produtos, atendimento e preços. Isso fez com o setor supermercadista ficasse mais competitivo não só entre si, mas também no enfrentamento às novas empresas que surgiram no ramo de alimentos – como padarias, casas especializadas de carnes, hortifrutis e pequenos produtores de orgânicos, por exemplo. Fato é que, como se sabe, um dos efeitos da pandemia foi o fechamento de muitas atividades – o que provocou a migração de empreendedores para o único setor que bem sobreviveu: o alimentício. E a concorrência aumentou para os supermercados.
A Instabilidade: O Sobe e Desce do Setor
Mas, a partir de abril de 2021, o cenário começou a mudar. Gradativamente, a partir de então, o comércio em geral foi reabrindo, bares e restaurantes voltaram a funcionar e os supermercados já não eram a única opção de consumo. Os preços dos alimentos começaram a subir enquanto o poder aquisitivo das pessoas diminuía, resultado da economia estagnada por tanto tempo e ainda pressionada pelo dólar alto, inflação de volta, e aumentos nos preços dos combustíveis e da energia elétrica. Foi uma junção de fatores que mexeram negativamente com o poder de compra dos consumidores.
Sobre isso, matéria no site da CNN Brasil Business, de agosto passado, diz que “ As vendas nas grandes redes de varejo de supermercados despencaram entre abril e junho/21, na comparação com o mesmo período do ano passado. A renda menor dos brasileiros, derrubada por conta da pandemia, o desemprego e a inflação são apontados como os responsáveis pela queda no consumo…” “Há um ano, vimos o auge, o pico das compras, recorda Eugênia Fonseca, gerente de marketing do grupo Hirota Food. Em maio, começou a acender a luz amarela. Em junho, a gente fechou 7% abaixo da meta. Em julho, a gente fechou igualmente baixo.”
Ainda segundo outra matéria sobre o tema, publicada em outubro pelo site Monitor Mercantil, “As vendas nos supermercados no Estado de São Paulo tiveram redução de 7,15% nos últimos 12 meses, conforme aponta o Índice de Vendas dos Supermercados (IVS), apurado pela Associação Paulista de Supermercados (APAS), com base no mês de agosto. Ao compararmos agosto de 2020 com agosto de 2021, o setor registrou queda de 10,46% no faturamento real. No acumulado do ano, de janeiro a agosto/21, o recuo no faturamento do setor supermercadista do Estado de São Paulo é de 10,01%. Para o Departamento de Economia e Pesquisa da APAS, o resultado pode ser explicado por dois fatores: a base de comparação do consumo em 2020, considerada a mais alta dos últimos anos; a crise que o país atravessa atualmente, com desempregos em níveis elevados; a alta variação de preços, que tem freado o consumo das famílias; e os custos da energia elétrica.”
Expectativas de Fim de Ano e Perspectivas para 2022
No final do ano, como sempre acontece, a expectativa é que o consumo nos supermercados volte a subir com as compras para as comemorações de Natal e Réveillon. As viagens voltam a acontecer com a pandemia mais controlada no país em função da vacinação, porém ainda bem mais tímidas do que há anos atrás – afinal, o poder aquisitivo das pessoas está reduzido; os preços dos combustíveis e das passagens aéreas estão nas alturas; as viagens internacionais em dólar ou euro são proibitivas para a grande maioria. Soma-se o isso, infelizmente, o fato de uma quarta onda da pandemia na Europa já estar fechando, de novo, muitos países por lá; e a ameaça da nova variante Ômicron surgida da África do Sul – que já se espalha pelas fronteiras e coloca o mundo em sinal de alerta diante do controle do coronavírus.
Isso tudo misturado, significa aumento previsto no consumo interno no País, durante as festas e o próximo verão. Será o que se espera um novo up de vendas para o setor, nessa gangorra de sobe e desce e de instabilidade que marcou o ano de 2021. Para 2022, permanecem juntos a dose de otimismo que não pode faltar; a enorme força de trabalho do comércio varejista; e as incertezas do nosso Brasil diante dos rumos da pandemia, da economia, e de um ano eleitoral pela frente. Nada menos do que mais um grande desafio para os supermercadistas.
APAS fala com exclusividade para a Checkout
Com 50 anos de tradição, a Associação Paulista de Supermercados (APAS) representa o setor supermercadista no Estado de São Paulo e busca integrar toda a cadeia de abastecimento com a sociedade. A entidade, que possui 3 distritais na cidade de São Paulo e 13 regionais pelo Estado, conta hoje com 1.505 supermercados associados que somam 4.315 lojas.
Atendendo à demanda jornalística da Revista Checkout, e colaborando com o conteúdo informativo desse veículo de comunicação dirigido aos supermercadistas, a APAS deixa aqui, com exclusividade para a revista e seus leitores, o seu posicionamento sobre a “Retrospectiva 2021 e a Perspectiva 2022” para o setor.
As análises abaixo são de Diego A. Pereira, economista do Departamento de Economia e Pesquisa da APAS. Acompanhe:
Restropectiva 2021 e Perspectivas 2022
“O ano de 2021 foi desafiador para todos os setores da economia e, para o varejo alimentar, não foi diferente. Foi um ano marcado pela alta de preços e a redução do poder de compra das famílias devido a uma série de fatores, como as pressões internacionais nos preços das commodities, a inflação que chegou à casa dos dois dígitos e o impacto que a cadeia produtiva tem sofrido com a alta dos preços dos combustíveis e da energia elétrica. O Índice de Preços dos Supermercados (IPS), calculado pela APAS/FIPE, registra alta de 0,94% para o mês de outubro, sendo 8,83% no acumulado do ano – de janeiro a outubro -; e de 12,99% nos últimos 12 meses. Outro elemento que contribuiu para a elevação dos preços foi o câmbio, uma vez que o preço elevado do dólar favorece as exportações.
O IPCA, o índice de inflação oficial, não ultrapassava os dois dígitos desde fevereiro de 2016, quando o acumulado em 12 meses registrou 10,36%. A expectativa é fecharmos o ano de 2021 com um IPCA em 9,77% e IGPM (outro índice de inflação) em 18,54%. A política monetária adotada pelo Banco Central começou a sinalizar aumento no controle nos preços em meados de outubro. Nesta toada, as projeções do setor estimam que a taxa Selic, a taxa básica de juros, feche 2021 na casa de 9,25% e o dólar fique em R$ 5,50.
Com a política econômica voltada ao controle da inflação, a perspectiva é que a taxa Selic fique na casa de 11% em 2022, o que deve reduzir o estoque de crédito em 9,3% ao ano. A projeção do mercado é que para 2022 o IPCA fique em torno de 4,79% e o IGPM, em 5,38%, aumentando assim o poder de compra e o consumo das famílias. Em contrapartida, a demanda internacional por commodities continuará pressionando os preços no mercado interno e o cenário político brasileiro deve pender nesta balança, como invariavelmente ocorre em anos de eleições presidenciais.
Neste cenário, o varejo alimentar prevê um crescimento de 1 ponto percentual no próximo ano, subindo dos 3% em 2021 para 4% em 2022. Este crescimento deve aquecer o mercado de trabalho, ampliando o número de trabalhadores empregados pelo essencial setor supermercadista, que deve fechar o ano de 2021 com mais de 585 mil colaboradores diretos.”