Com foco cada vez mais nos clientes e com orientação para resultados, o gerenciamento por categoria virou uma ferramenta para atrair o público-alvo e aumentar a receita da loja.
Fazer compras anos atrás tinha uma lógica bastante previsível. Os armazéns abasteciam suas prateleiras com produtos de uso comum, como arroz, feijão e farinha e as donas de casa compravam as mercadorias com dinheiro em espécie para suprir a necessidade da família, composta por mãe, pai e filhos. Essa cena ainda acontece, mas está acompanhada de inúmeras variáveis que faz com que o processo de compra e venda deixe de ser automático e passe a ser plural, com possibilidades diversas. A partir dos anos 80, os profissionais de marketing descobriram que era possível vender as commodities com apelos populares criando diferenciais e seduzindo o cliente por meio de qualidades intangíveis, isto é, que vão além das propriedades primárias. Comprar arroz passava a ir muito além de levar para casa apenas grãos nutritivos.
Da mesma forma, as famílias evoluíram e os novos arranjos fizeram com que os supermercados ganhassem novos públicos. Além da composição tradicional, há casais sem filhos, amigos que decidem morar juntos, relações homoafetivas, pais e mães solos e uma quantidade de brasileiros que vivem sozinhos, tendência essa que aumenta anualmente. De acordo com Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad Contínua), divulgada em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontou que 16,2% dos lares são formados apenas por um morador. O número é maior do que a pesquisa de 2018, quando 15,5% de brasileiros viviam nessa configuração.
Tanta evolução exigiu dos empresários supermercadistas um olhar atento para a forma de ofertar seu mix de produtos ao público, agora tão diversificado. De olho nessa nova realidade, muitos passaram a adotar o gerenciamento por categoria como a melhor estratégia para agradar o shopper e, com isso, alavancar as vendas de itens essenciais para os negócios.
Mais do que organizar as prateleiras, essa técnica é resultado de uma inteligência que acompanha toda a disposição das mercadorias em loja, favorecendo tanto o cliente final quanto o fornecedor. Visa conhecer o cliente e identificar o caminho que ele percorre pelos corredores para disponibilizar sempre produtos que ele tem a intenção de comprar – ou que ele pode vir a se interessar.
A ideia principal dessa ferramenta é saber, por exemplo, qual refrigerante os clientes mais consomem. Se optam sempre pela mesma marca ou se variam a compra para conhecer novos sabores. Se preferem a linha zero ou a com açúcar. Saber exatamente o que seu público mais adquire ajuda a traçar estratégias para vender ainda mais. Essa leitura garante que toda a gama de produtos atinja o público correto.
A tecnologia é um facilitador nessa tarefa diária. Ferramentas que conectam as compras ao estoque indicam quando determinada mercadoria está perto de esgotar. Isso auxilia na reposição e proporciona uma melhor experiência, uma vez que sempre haverá o item desejado. Há ainda plataformas de gestão de clientes que identificam as preferências e os hábitos personalizados de consumo dos frequentadores com base no que eles mais levam.
Algumas técnicas ajudam os gestores a colocar em prática soluções a partir da coleta de informações. Uma delas é a curva ABC, um método que classifica e dispõe as mercadorias de acordo com a importância para cada loja. Neste esquema, faz-se um ranqueamento de acordo com aqueles que trazem mais retorno para a empresa. Geralmente, 20% dos itens respondem por 80% do lucro. Essa segmentação permite que o gestor dê maior atenção aos produtos mais lucrativos; isto é, de forma estratégica, sempre deve haver para reposição aqueles poucos de maior receita da loja. Isso evita que o estoque fique preenchido de artigos de pouca rentabilidade.
Com dados precisos, o supermercadista saberá organizar a loja de acordo com a preferência dos visitantes. Por exemplo, se a linha de molho de tomates é composta por dez marcas diferentes e somente três respondem por mais de 80% das vendas, é preciso repensar a forma de comercializar os outros sete da lista. Diante dessas informações, é possível criar novas estratégias para alavancar as vendas e até mesmo atrair novos consumidores. Entram nessa gestão para maximizar os ganhos a precificação, a comunicação atrativa e ofertas pontuais.
Portanto, é preciso saber em qual categoria se encaixa cada produto comercializado. Eles podem ser de quatro naturezas: de destino: no qual a loja é referência e que atrai a maior parte dos clientes; de rotina, aqueles adquiridos a partir de outras compras; de conveniência, levados por necessidade ou urgência e, por fim, de sazonalidade, ofertados e vendidos em épocas específicas, como datas festivas. Com essa análise, é possível traçar oportunidades para cada uma, extraindo a melhor forma de comercialização a partir da frequência e interesse dos clientes.
A prática do Gerenciamento por Categoria
Em webinar realizado em maio pela Associação Paulista de Supermercados (APAS), a connect shopper Fátima Merlin contou que 60% do resultado das vendas se deve a um mix de produtos adequado e precificado corretamente. Isso faz com que não exista um superestoque e nem rupturas de bens de pouca relevância. Ela explica: “tem que se levar em conta a proposta de valor, o shopper-alvo, a estrutura, o tamanho e a regionalidade da loja. “É preciso definir estratégias para cada segmento, sempre tendo em mente três critérios: a visibilidade, a acessibilidade e a disponibilidade do que se oferta. 80% da conversão está atrelada ao posicionamento e à localização, de forma que tenham sinergia e correlação com os demais itens”, explica Fátima, que acredita que quando mais se insere a técnica, mas ela se adapta à rotina dos colaboradores.
Quem divide dessa opinião é Eloá Ribeiro, coordenadora de projetos do Juba Supermercados. No mesmo evento, ela disse que ter o diretor comercial como aliado do gerenciamento de categoria foi essencial para a implementação desse modelo de gestão. “Ter um sponsor (padrinho) que engaja e leva adianta a relevância do tema é essencial, mas é preciso também um plano de ação que ensine os colaboradores a mexer com planilhas, gráficos e análise de dados para compreensão da relevância de pensar nos produtos com base em evidências e não apenas no feeling”, relatou Eloá. Ela ainda exemplificou que, a partir dessa estratégia, já foi revista a forma de exposição de artigos como cervejas, olhando com foco para a maior lucratividade do mix.
Paula Vani, gerente de desenvolvimento comercial da Lopes Supermercados, também no webinar da APAS, relatou que o sortimento é um desafio devido à quantidade de lançamentos que a indústria coloca à disposição dos lojistas. “O gerenciamento por categoria dá esse suporte para a área comercial, de forma a customizar os volumes por cluster. É preciso olhar para o shopper, mas também atender a estratégia do varejista”, reforça Paula, que também contou que os iogurtes passaram a ter mais saída após a revisão da forma de expô-los.
Outra vantagem dessa atividade é que permite ao supermercadista gerenciar com mais precisão as categorias e, com isso, planejar com antecedência a reposição dos itens junto aos fornecedores. Isso também otimiza os espaços de loja para realização de merchandising estratégicos para maior retorno em vendas, como ilhas de produtos e degustação (em épocas de não pandemia). Essas iniciativas tornam a rotina, tanto do supermercadista, quanto do industriário, mais rentável, pois já partem de um histórico de conhecimento sobre preferências comerciais. Os dados, mais do que nunca, se tornam ferramentas para alavancar vendas e ampliar a sinergia das equipes.