O Poder Detonador da Rotatividade
Entenda as causas e procure soluções para baixar os níveis e desarmar essa bomba
Por Eliane Carone
A alta rotatividade, ou turnover em inglês, é um fator de expressivo desgaste e elevados prejuízos no setor supermercadista: o entra e sai constante de funcionários desestabiliza a formação de equipes, invalida treinamentos, sobrecarrega os demais colaboradores e coloca as empresas em constante clima de tensão. Isso sem contar o capítulo dos encargos com a rescisão de contratos.
A taxa de rotativo de colaboradores, como também é conhecida, é um indicador se essa rotatividade está dentro dos padrões normais ou acima do aceitável para uma estabilidade nas empresas. E, infelizmente, ela é elevadíssima no segmento: de 40%, quando 6% são tidos como o admissível. É preocupante.
É um constante “enxugar de gelo”, que deixa sempre um rastro escorregadio na administração do dia a dia das lojas. É como um looping (repetiçãoautomática de uma ocorrência), de onde não se consegue sair facilmente. Importante, portanto, é saber onde está o botão para se desligar esse círculo vicioso. É este o segredo de muitas chaves de portais que vamos abrir aqui, na procura de entender e estancar esse processo.
Os motivos da rotatividade
São muitos os porquês que justificam a não permanência de muitos dos funcionários nos supermercados. A começar pela carga horária, que é estafante pela própria característica do comércio, com escalas nos fins de semana, feriados e períodos noturnos; passando pelo despreparo e falta de conhecimento das atividades de novos colaboradores; pelo baixo nível de formação para acompanhar as demandas; pelas falhas no treinamento dos novatos e aprendizes; pela falta de motivação e engajamento com os objetivos da empresa; pela desmotivação quanto às perspectivas de crescimento profissional e realização de sonhos pessoais de se fazer carreira; até chegar nos baixos salários e poucos benefícios para suprir as necessidades de cada um. Pronto, está completo o tempero para ferver o caldo indigesto dos contínuos desligamentos.
De qualquer forma, sejam lá os motivos do turnover em cada empresa, é preciso que eles sejam identificados para se evitá-los nas presentes e novas contratações. Afinal, nada muda se não houver ajustes para acertar a mão nessa arte de temperar conflitos. É preciso, de fato, muitas pitadas de técnica e sensibilidade para lidar com recursos humanos.
Mas não é só. Fatores externos que interfiram no comércio e exijam altas demandas dos funcionários – como cenários econômicos desafiadores ou uma pandemia como temos agora -, também podem fazer oscilar, para cima ou para baixo, o índice percentual da rotatividade. É o que veremos.
O fator pandemia
Enquanto o mundo parou, o supermercadista acelerou na pandemia. Foi uma mudança radical no setor que exigiu adaptações rápidas para responder às necessidades maiores dos consumidores. A procura pelos itens dos supermercados não só cresceu, como a ida a esses estabelecimentos se tornou quase a única alternativa para se sair de casa – virou até programa! Mais que isso, a opção pelo e-commerce aumentou tanto e exponencialmente, ficando quase como um negócio dentro do outro a ser gerido pelos supermercados.
Assim, uma roda de acontecimentos engrenados começou a girar nesse planeta varejista: mais movimento nas lojas, mais gente para atender o fluxo; muitos mais acessos de compras online, grande crescimento dessa estrutura de vendas; maior concorrência, mais estratégias para atrair os clientes; mais pressão por melhores resultados, maiores investimentos; maior exigência dos clientes com novos hábitos de consumo, mais qualidade nos serviços…
Este cenário todo atípico nos supermercados, criado nesse tempo de pandemia, impactou igualmente o quadro de funcionários – com mais contratações. Mais contratações, logo mais pessoal, mais treinamento – e também maior preocupação com demissões em um momento altamente delicado. Pois se nas condições normais de temperatura e pressão o tema já provoca alta tensão no setor, imagine nesse tempo…
Mas o que se percebe, também de forma atípica, é que a alta rotatividade deu uma baixada de nível em razão do aumento da taxa de desemprego no país, da insegurança dos trabalhadores, e com a maioria das outras atividades comerciais fechada. Os pedidos de demissão foram reduzidos e as demissões também, o que demonstra um esforço conjunto do setor no cumprimento do grande protagonismo que tem neste momento de pandemia.
Mas não se iluda: o fantasma do turnover não deixa nunca de assombrar!
A arte de reter talentos
Não é fácil engajar os colaboradores na filosofia da empresa, muito menos reter os talentos que passam muitas vezes tão rapidamente, e despercebidos, em meio a tantos funcionários e atividades realizadas nas lojas. Ainda mais em tempos de crise, como dessa pandemia, quando o supermercadista já tem um caminhão de problemas para resolver.
Por isso, ter um departamento de RH (recursos humanos) é uma ferramenta importante no assunto, ou mesmo recorrer a uma assessoria terceirizada na área é sempre uma luz no caminho. A verdade é que investir nessa especialização pode transformar os prejuízos com a alta rotatividade em benefícios para a empresa.
Portanto, as ações utilizadas e orientadas pelo RH são o segredo das muitas chaves para se abrir um novo horizonte no tratamento do “fator gente” nos supermercados, podendo transformar o paradigma da alta rotatividade em maior estabilidade.
Vamos a elas para desvendar esse mistério:
- Compartilhar a filosofia da empresa com os colaboradores
- Motivar os colaboradores para o engajamento em objetivos comuns
- Realizar treinamentos e capacitação de tarefas
- Qualificar lideranças com cursos e aprendizados
- Formar equipes em sintonia
- Criar planos de carreira para promover crescimentos
- Remunerar de forma justa
- Praticar benefícios, como planos de saúde
- Adotar escalas equilibradas de trabalho
- Adotar um clima positivo organizacional
- Promover relacionamentos amistosos, com dinâmicas externas
- Manter um canal de comunicação da empresa com o feedback dos funcionários
- Promover a empatia entre empresa e colaboradores
Como se pode ver, são medidas possíveis de serem praticadas no setor – se não todas, pelo menos uma boa parte delas, para se desarmar o fio de alta tensão ou a bomba da rotatividade. Vale a tentativa. Porque praticar o varejo é aprender, todos os dias, que o bom marinheiro sempre consegue chegar a um porto seguro, mesmo navegando em meio a grandes tempestades.