A maioria dos supermercados tem perdas em FLV superiores à média nacional, que gira em torno dos 3,7% sobre o faturamento do departamento. Um bom trabalho de prevenção pode conduzir os número a patamares aceitáveis
Lana de Paula
O setor supermercadista registrou 1,79% de perdas sobre o faturamento bruto em 2020, de acordo com a 21ª Avaliação de Perdas no Varejo Brasileiro de Supermercados, realizada pelo Departamento de Economia e Pesquisa da ABRAS. Esse índice representa um total estimado de R$ 7,6 bilhões.
A quebra operacional, que chegou à casa dos 47,9%, lidera o ranking das causas e o FLV sai na frente entre as seções que lideram os índices de perdas (por faturamento bruto) entre os perecíveis, com 5,25%.
A Avaliação foi realizada com base nas informações de 228 redes supermercadistas, que somam 3.576 lojas no País e faturamento bruto de R$ 49,9 bilhões em 2020. Do total de respondentes da pesquisa, 72% possuem área de prevenção de perdas, ante 71% no ano anterior. A falta de justificativa do investimento e o alto custo de manutenção foram citados pelos supermercadistas como principais fatores da falta da área de prevenção de perdas na empresa.
Vale ressaltar que o FLV tem uma participação importante no varejo alimentar. Por serem altamente perecíveis, sua perda pode girar em torno de 3% e 10%, sendo que muitos fatores influenciam este indicador. De acordo com o diretor comercial da assessoria para varejo R-Dias, Gustavo Fleubert, nesse setor, uma perda controlada está perto dos 4%, “Em muitos casos encontramos perdas acima de 8%, chegando até 12% o que já é um total desperdício e causa grande impacto nos lucros da operação”, ressalta.
Fleubert explica que as perdas nos supermercados são tratadas de duas formas:
- Identificadas – aquelas em que o varejista consegue apurar ou identificar de forma clara como, por exemplo, as perdas no FLV por apodrecimento.
- Não identificadas – as que aparecem quando a empresa realiza os inventários. Tendo como premissa que as movimentações sistêmicas foram realizadas corretamente e, ao realizar o inventário, a quantidade de itens é divergente do sistema, quando a menor temos uma perda não identificada. Não se sabe a origem dessa perda, que pode até ser furto na entrada de mercadoria ou na própria loja.
Definição das causas ajuda no controle
No que diz respeito às perdas do FLV, as causas são diversas e o diretor da R-Dias cita algumas delas:
- Compra exagerada – quanto mais estoque, acima dos 3 dias, mais quebras;
- Estoque excessivo – manutenção de estoque do FLV no depósito;
- Recebimento incorreto – ausência de controle e/ou pesagem na entrada;
- Armazenamento errado – empilhamento incorreto, calor e umidade;
- Alto volume de exposição – bancas com diversos níveis de altura e compressão dos níveis inferiores.
Para apurar e reduzir as perdas do FLV todos esses pontos devem ser levados em consideração. “O estoque excessivo, por exemplo, é um grande vilão. Quando temos o produto exposto por mais de 3 dias, o indicador da perda do setor tende a subir, ou seja, um bom estoque de FLV é inferior a 3 dias e isso é uma situação que deve ser analisada pela operação de loja e pelo departamento comercial da empresa” avisa Fleubert.
O diretor da assessoria para varejo explica que nesse cenário é preciso colocar a inteligência para reduzir as perdas. Analisar o indicador principal é importante, mas é preciso analisar principalmente as causas que têm relação direta com indicador. Para isso, o primeiro passo é identificar as quebras do FLV e a partir desse ponto analisar e entender em profundidade o que acontece com cada tipo de produto.
“Um ponto relevante é que FLV vai quebrar. Por isso temos parâmetros perto dos 4% nesse setor. Muitos varejistas seguram as compras para impedir a quebra e acabam causando outro problema, a ruptura, a falta do produto na banca. Para criar uma área de inteligência em redução das perdas o principal ponto é o engajamento da direção. A alta gestão precisa decidir que quer resolver essa questão e apoiar os envolvidos com informações e ferramentas necessárias nessa jornada”, afirma Fleubert.
Inteligência em redução de perdas no Supermercado Antonelli
Em oito meses de trabalho o supermercado Antonelli conseguiu reduzir as perdas de 7,5% para 3,7%
Ao iniciar a implantação do projeto de prevenção de perdas na rede Antonelli, os especialistas da assessoria para varejo sugeriram trazer alguém do mercado para gerenciar a implantação, evitando assim vícios e costumes.
A visão de Fábio Simões Rosa quando chegou ao Antonelli para assumir a área de inteligência em prevenção era a de um cenário no FLV com quebra que girava em torno de 7,5%. “Não havia controle, nem gestão. Ao começarmos a implantar a prevenção de perdas, logo reunimos a equipe para um treinamento e para mostrar a eles que havia uma grande oportunidade para um trabalho de redução dessas perdas”, conta.
A conscientização dos funcionários sobre a importância da atitude pessoal e o comprometimento com a qualidade no combate ao desperdício e à perda é uma ação muito importante, tanto para o trabalho a ser feito como para a vida particular.
O passo seguinte, segundo Fábio, foi fazer um levantamento e verificar onde havia oportunidade de estancar aquelas perdas. Na sequência, fizeram uma reunião com o encarregado, mostrando a ele o resultado atual, os pontos chaves que estavam levando àquele resultado de 7%, qual seria o melhor caminho para se trabalhar esse cenário e o resultado a que poderiam chegar.
“Fizemos um treinamento com o encarregado, a equipe, o gerente e o subgerente de loja e aí foi criada uma ferramenta onde o próprio encarregado conseguia ver diariamente as quebras lançadas. Antes, elas não eram lançadas rigorosamente e eram feitas de forma única, ou seja, não se sabia se era quebra por maturação, por avaria o outro motivo. Foram criadas várias tipologias de quebra de forma que quando fizéssemos o lançamento o encarregado saberia qual era a quebra diária, semanal e mensal, a causa daquela quebra real, como estava a venda e a quebra relacionada à venda.
Acompanhamento minucioso
O trabalho no Antonelli prosseguiu com reuniões mensais com o encarregado do FLV. “Fazíamos o Top 10 dos produtos que mais tinham quebrado. Mostrávamos ao encarregado, por exemplo, que a batata quebrou 50 Kg essa semana, fazendo o mesmo com os demais produtos que mais estavam quebrando. E o encarregado tinha que criar um plano de ação em cima desses 10 produtos que a gente estava apontando”, relata Fábio.
Ele explica que era missão do encarregado da seção verificar o motivo de quebra junto com o comprador, se era uma compra em excesso, se era a qualidade do produto que estava chegando muito ruim na loja e um dia depois já tinha que descartar, se havia algum erro na exposição. Ou seja, através daquele apontamento para o encarregado, ele atuava.
“Na semana seguinte pegávamos os 10 produtos da semana anterior e comparávamos a com a situação atual após a ação do encarregado. Se os 10 produtos tivessem dado bom resultado já apontávamos 10 outros para a próxima semana. Fomos trabalhando assim semanalmente e, quando foi pegando o ritmo, quando todo mundo começou a entender que dá pra acontecer, passamos a fazer reuniões quinzenais”, diz ele.
Todo esse esforço da equipe seguiu até a seção chegasse ao patamar desejado, que era de 3,5% a 3,7%. Segundo Fábio, o trabalho levou em torno de oito meses e foi bem gradativo, fechando com 7%, depois com 6% e assim por diante. “Não é um resultado do dia para a noite. Depende de muito trabalho porque o FLV sempre vai quebrar. Conseguimos baixar e depois foi só manter. Hoje está na casa dos 3,7%-3,8%”, comemora.
Para Fábio, o supermercado que não faz prevenção de perdas não sabe a dimensão de perda financeira que tem. Ele explica que muitas vezes o varejista olha por cima, mas quando vai aprofundar os números a realidade assusta. Depois, quando vão ajustando se dão conta de como a prevenção é importante. “Não vai ter como estancar tudo, mas enquanto quem tem prevenção perde 1,5% do faturamento geral, quem não tem passa dos 2,5% – 3%, um valor muito grande. A prevenção de perdas vem para implantar processos e controle para que o resultado apareça”, afirma.